O futuro Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) pode
incluir regras para desobrigar as companhias aéreas de indenizar os passageiros
por prejuízos que venham a sofrer em decorrência de atrasos ou cancelamentos de
voos causados por fatos considerados de força maior, como eventos climáticos,
acidentes ou problemas operacionais que provoquem a interrupção de pousos e
decolagens. Dispositivo com essa finalidade foi sugerido nesta segunda-feira
(19) à comissão de especialistas encarregada de elaborar o anteprojeto do novo
código.
A proposta consta de relatório apresentado pelo
advogado Ricardo Bernardi, especialista em Direito Aeronáutico. Na visão do
advogado, a medida é harmônica com a teoria da responsabilidade civil, que
resguarda pessoas físicas e jurídicas de reparar danos por motivo de força
maior. De modo prático, o texto do CBA passaria a especificar situações habituais do transporte aéreo que
afetam a vida do passageiro, mas decorrem de acontecimentos fora da
responsabilidade das companhias.
— Força maior quebra o nexo. Então, não há obrigação
de indenizar. É isso que estamos propondo. É um princípio de direito que
queremos transpor para o código — reforçou em entrevista.
Furacão
Bernardi citou como fato característico a eventual
interrupção das operações de um aeroporto devido a problemas no sistema de
controle dos voos. Mencionou ainda a hipótese de um furacão nos Estados Unidos,
no meio da rota de voos entre o Brasil e
aquele país.
— É óbvio que o voo não vai sair daqui e passar pelo
meio de um furacão, o que decorrerá atraso. Agora, imputar à companhia aérea
todo o ônus decorrente deste atraso fora do controle dela também não parece
razoável — argumentou.
O advogado admitiu que há outros pontos de vista em
relação à questão, inclusive com base na ideia de que essas ocorrências são
parte do risco do negócio. Ressaltou, contudo, que transferir o risco para as
empresas provoca aumento dos valores envolvidos na prestação do serviço. Do
ponto de vista econômico, explicou, isso resultará na elevação dos preços das
passagens aéreas.
Para cobrar indenizações por danos, normalmente os
passageiros recorrem aos Procons e ao Judiciário. Durante a audiência, membros
da comissão destacaram que no país as decisões judiciais costumam favorecer os
consumidores, considerados hiposuficentes (parte mais frágil nas relações de
consumo).
Assistência
Ainda na visão do advogado, o princípio da exclusão
de responsabilidade por motivo de força desobrigaria as empresas aéreas até
mesmo de prestar assistência material aos passageiros retidos nos aeroportos. A
depender do tempo de atraso, segundo regras da Agência Nacional de Aviação
Civil (Anac), hoje os passageiros devem dispor de telefone para comunicações,
alimentação ou mesmo hospedagem.
Ricardo Bisinotto Catanant, que chefia o Departamento
de Serviços Aéreos da Anac, pediu cuidado no exame da proposta da exclusão da
responsabilidade por motivo de força maior. Segundo ele, a medida pode causar
impacto severo na vida do passageiro em situações de atraso e mesmo de mudança
de pouso para aeroporto diferente do programado.
Bernardi admitiu na entrevista que essas implicações
devem ser bem avaliadas, pois o passageiro não pode mesmo ficar desamparado.
Porém, considerou necessário também discutir em que a assistência material deve
caber exclusivamente à companhia aérea. A seu ver, outros agentes do sistema
podem compartilhar a obrigação.
Franquia de bagagem
O relatório apresentado por Bernardi inclui ainda
sugestão para que seja desregulamentada as regras sobre franquia de bagagem,
com liberdade de fixação de preços pelo próprio mercado, esse o princípio já
adotado no país para os preços dos bilhetes. Pela lógica de mercado, avalia o
advogado, bilhetes sem franquia podem ter preços mais baixos.
Atualmente, em trechos nacionais os passageiros contam
com uma franquia de bagagem de até 23 quilos. Nos voos internacionais que
partem do Brasil, o limite é de 32 quilos. Segundo Bernardi, outros países não
impõem franquias às empresas.
— O problema é que o passageiro que não quer levar
32 quilos, que leva dez quilos ou que não quer levar nada está pagando, no
final das contas, pelos 32 quilos do outro — justificou.
Outra sugestão é no sentido da flexibilização das
regras referentes aos prazos de validade dos bilhetes. Bernardi observou que
hoje já é possível comprar um bilhete por menor valor se a tarifa tem multa
maior no caso de pedido de reembolso. O mesmo se aplicaria aos prazos dos
bilhetes: aqueles com validade de tempo maior tenderiam a ter valores mais
alto, e os de prazo mais curto seriam mais baratos.
Fonte:
12.senado.leg.br